A origem do nome Odivelas está como o nome de tantas outras freguesias e concelhos de Portugal, envolto numa lenda que tem perpassado pelos séculos. A propósito do nome desta cidade, conta-se que D. Dinis tinha o hábito de deslocar-se à noite a Odivelas ao Mosteiro de S. Dinis e certa noite, sabendo a rainha do que se passava resolveu esperá-lo e quando o rei fazia o seu percurso para o encontro, a rainha interpelou-o e eis que proferiu as seguintes palavras: "- Ide vê-las senhor." Pelo que, segundo a lenda, a expressão "Ide vê-las", por evolução, terá dado o nome a Odivelas.
O topónimo, no entanto, atesta apenas à nomeação pelos muçulmanos, do rio que corre na região de Odivelas, tendo este hidrónimo passado igualmente a topónimo, de modo semelhante ao que aconteceu ao de Odemira. Assim sendo poderá ter sido já no domínio cristão que o nome se teria transmudado em nome da terra que banhava, de qualquer forma o topónimo Odivelas surge pela primeira vez na documentação logo em 1190, mencionada na compra que o Mosteiro de S. Vicente faz de umas herdades em Odivelas, ao comendador do Hospital de S. João de Lisboa, Paio, em Outubro de 1190, juntamente com outras herdades em Bucelas e na Romeira.
Na filologia, a palavra é composta por dois elementos “Odi” e “velas”, sendo o primeiro de origem árabe e tendo como significado ”curso de água”. Segundo José Pedro Machado, no Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, refere o seguinte na entrada Odivelas: «topónimo. Ferreira do Alentejo, Loures; ribeiro afluente. Sabe-se que o árabe uad, vulgar od- (“rio”) se torna Ode- em português quando a seguir se lhe junta vocábulo começado por consoante (Odesseixe, Odeleite, Odemira), mas é Odi quando antecede palavra iniciada por vogal (Odiana, Odiel). A segunda parte do vocábulo Odivelas continua obscura, crendo-se derivar do pré-romano *belis, “negro, escuro”.» Na documentação régia referente ao Mosteiro de S. Dinis,datados do Século XIII e XIV, o topónimo é identificado como odivelas.
No que diz respeito à evolução histórica e à presença humana no território de Odivelas, no planalto e encosta nascente do Campo de Trigache conheciam-se pelo menos 6 sepulcros megalíticos, dos quais subsiste hoje a anta de Pedras Grandes, classificada como Monumento Nacional desde meados do século XX, sendo o edifício mais antigo de Odivelas, com cerca de 5000 anos de idade. O dólmen das Batalhas, na freguesia de Caneças, o Castro da Amoreira na freguesia da Ramada, os vestígios romanos encontrados na Póvoa de Santo Adrião, os achados árabes no subsolo da Paiã, na freguesia da Pontinha, confirmam o território como uma zona fértil e agradável, onde, ao longo dos séculos, atesta a vivência humana na região. O incremento inicial da região parece ter sido, durante o século XIII com o Rei D. Dinis, ao decidir erguer, em Odivelas, um Mosteiro, de invocação a S. Dinis e a S. Bernardo, que foi doado às monjas Bernardas da Ordem de Cister. De estilo Gótico Primitivo Cisterciense, foi edificado de acordo com o modelo estabelecido, pelo reformador da Ordem, São Bernardo de Claraval atraindo às suas imediações, reis, príncipes e artistas. Nomeadamente alberga ainda hoje o túmulo de D. Dinis do séc. XIV, uma das mais emblemáticas obras da escultura tumular medieval.
Segundo as fontes históricas disponíveis, no Lugar de Odivelas, dentro do Couto das Religiosas, realizava-se todos os anos no dia de S. Dionísio, 9 de Outubro, uma feira franca, onde se comercializavam na sua maioria produtos ligados à agricultura e ao gado. A referida feira foi instituída no reinado de D. Dinis, sendo muito concorrida pelo povo dos arredores e mesmo pela fidalguia da Corte. Esta feira anual era ainda descrita como um momento solene, onde as monjas trajavam os seus melhores hábitos e quando davam a conhecer a sua arte de fazer os seus tão apreciados doces, nomeadamente o Manjar Branco, o Manjar Real, os Suspiros, a Marmelada e o Bolo Podre. Em Caneças e na Póvoa de Stº Adrião são também referenciadas feiras, sendo que a de Caneças, surge indicada nos finais do século XVIII, quando D. José I autorizou para a realização de uma feira franca e livre sobre todos os géneros vendido no Rossio (L. Vieira Caldas) que começava na Páscoa e durava 3 dias e a da Póvoa de Stº Adrião, de que há notícia no início do século XIX que se realizava a 10 de Agosto.
É no Mosteiro de Odivelas, em 1415, que D. Filipa de Lencastre, já no leito de morte, abençoa os três filhos mais velhos (D. Duarte, D. Pedro e D. Henrique) que partem dali, a cavalo, em direção ao Restelo, onde embarcam para Ceuta. Outras figuras de relevo cultural estão associadas a este local, pois no mesmo Mosteiro é representado pela primeira vez, em 1534, o «Auto da Cananeia», de Gil Vicente, encomendado pela abadessa Violante, irmã de Pedro Álvares Cabral. O Padre António Vieira fez um dos seus sermões no Mosteiro de Odivelas, a 22 de Junho de 1668. E ainda, Almeida Garrett que ocupa o preâmbulo da «Lírica de João Mínimo» com uma descrição de um passeio ao Convento, entrecortada por várias dissertações sobre poesia.
A 11 de Maio 1671 um roubo na Igreja de Odivelas dá origem a um belo monumento, o «Senhor Roubado», que alguns descrevem como sendo a primeira banda desenhada portuguesa, e que levanta muitas pistas sobre a forte presença da Inquisição na região.
Missionários cansados e doentes que regressavam da Ásia ou de África acolhiam-se também na região, nomeadamente no Casal Novo, na Paiã, propriedade que tinha sido adquirida pelos religiosos do Convento de Rilhafoles. Diversos episódios estão também ligados ao Mosteiro ao longo dos tempos, nomeadamente durante o século XVIII, como foi o caso da entrada no Mosteiro de Odivelas de uma monja brasileira que algumas madres julgavam judia. Nem mesmo o inquérito de um cardeal inquisidor as demove da suspeita, o que as leva a exigir a expulsão da “herege”. Em procissão, lá vão a caminho de Lisboa para se queixarem ao rei, que não as recebe. À força, soldados pegam-lhes ao colo e metem-nas em carruagens, devolvendo-as ao Mosteiro.
No Mosteiro professava ainda a célebre Madre Paula, por quem o Rei. D. João V, 30 anos mais velho, se terá apaixonado dando origem à mais séria e duradoura paixão deste rei, que lhe mandou construir uma luxuosa habitação, junto à torre, por cima da casa do Capítulo.
Em 1731, D. João V decreta o início da construção do Aqueduto das Águas Livres, com origem na Fonte das Águas Livres, perto de Carenque, indo desaguar no depósito das Amoreiras, cuja Mãe d'Água foi terminada em 1834. A Mãe d'Água nas Amoreiras, além de ser um bonito espaço, é um depósito com capacidade para 5 500 000 litros. A partir das Mães d'Água a água seguia, através de túneis subterrâneos, que a levavam até às numerosas fontes de Lisboa. O Aqueduto das Águas Livres nunca foi totalmente eficaz porque o caudal de água era insuficiente para as necessidades da cidade. Não se sabe a data concreta da construção dos aquedutos de Caneças, mas situa-se por volta da segunda metade do século XVIII. Estes são quatro: o do Olival do Santíssimo, o do Poço da Bomba, o do Vale da Moura e o do Carvalheiro.
Nos terrenos férteis de Odivelas multiplicam-se as quintas, na Pontinha (na Paiã chegou a haver um cais para escoar os víveres para Lisboa), na Póvoa de Santo Adrião e em Caneças. Os seus proprietários, de uma forma ou de outra, surgem amiúdes ligados ao comércio e à cultura. É o caso do pintor Vieira Lusitano que foi o centro de uma romântica e atribulada história de amor com uma das filhas dos donos da Quinta dos Falcões, na Pontinha. Anos depois, será a Póvoa de Santo Adrião a ter como proprietário de uma das suas quintas, o pintor Pedro Alexandrino que não só deixou algumas obras na igreja local, como as espalhou por Lisboa - na Sé, no Palácio de Queluz e no Museu dos Coches.
O terramoto de 1755 causou grandes estragos na região mas leva também a que muitos lisboetas se venham fixar na zona, à procura de ares mais saudáveis.
Segundo as Memórias Paroquiais, redigidas a 16 de Abril de 1758, o dito Lugar de Odivellas situava-se no termo de Lisboa e de acordo com a informação do Cura Joaquim Lopes Cardozo, compreendia a dita freguezia além do lugar de Odivelas, que tinha 425 pessoas, o lugar dos Pombais, que tinha 195 pessoas, o lugar do Porto, que tinha 63 pessoas, o lugar da Amoreira (que fica na serra) que tinha 69 pessoas, o lugar de Famões que tinha 44 pessoas e o lugar de Trigache que tinha 46 pessoas. A freguesia de Odivelas, compreendia além dos lugares acima declarados, o sítio da Urmeira que antigamente se chamava Ulmeyra, por causa das muitas árvores de ulmos que naquele sítio havia, o sítio do Vale de Deus, que tinha 22 pessoas, o sítio dos Alvitos que tinha 21 pessoas, o sítio da Ramada, que era todo moinhos de água, onde se moía trigo, tinha 59 pessoas. Além disso existiam também nesta freguesia muitos casais e várias quintas.
O mesmo documento dá-nos conta ainda de outras descrições sobre o território, nomeadamente orográficas, tais como: “o rio desta terra tinha a sua origem “nas águas do inverno, começa a correr no lugar de Caneças da freguesia de Loures, entrando nesta de Odivelas, vai continuando o seu curso pelo sítio da Ramada, passa por uma ponte de cantaria de um só arco, que fica por cima deste lugar, onde chamam Vila Ladra, e encostado ao muro da Cerca das Religiosas … e continuando o seu curso passam também a ponte da Póvoa de Santo Adrião, que é de cantaria, e se vão meter no braço do mar de Frielas, onde finam”.
Da mesma forma podemos caraterizar algumas funções territoriais de Odivelas, como por exemplo, comprovar a existência de 16 moinhos, uma vez que as águas do rio estavam repartidas por açudes que moíam trigo, maioritariamente de três engenhos, existindo alguns de dois e um Lagar de Azeite que pertencia às Religiosas. Mas no que diz respeito aos produtos agrícolas que os moradores de Odivelas mais recolhiam, eram o trigo, a cevada e algum vinho.
Mais tarde, em 1833, na sequência de um surto de cólera, é construído, na Quinta da Pentieira, na freguesia da Pontinha, um cemitério para sepultar as respetivas vítimas.
Até meados do século XIX, Lisboa era uma cidade suja, afetada por numerosas epidemias. Os cidadãos ricos pagavam aos Aguadeiros, entre os quais os de Caneças, para lhes levarem água a casa. Caneças e as suas águas eram, então, muito apreciadas pela sua qualidade. Situam-se na freguesia de Caneças um conjunto de Fontes, que comercializaram água e que constituem um marco de uma época e de modos de vida caraterísticos da freguesia, e em sentido mais lato, do concelho. A venda da água de Caneças fazia-se através de carroças ou galeras, que transportavam para Lisboa e arredores a água em bilhas de barro, juntamente com as trouxas de roupa das lavadeiras e produtos hortícolas.
Com a extinção das ordens religiosas, a terra perde algum do seu fulgor, mas no início do séc. XX era, contudo, uma terra procurada para os prazeres do Verão, pelos senhores de Lisboa. É por essa altura que a vida municipal local começa a desenvolver-se. As freguesias de Odivelas e Pontinha fazem parte do Município de Belém, na altura em que este é presidido pelo escritor Alexandre Herculano. As duas freguesias passam, a integrar o Município dos Olivais em 1885. No ano seguinte, é instituído o Município de Loures, de que fazem parte algumas freguesias que hoje pertencem ao Concelho de Odivelas. Em 1915 é criada a Freguesia de Caneças.
Outro tipo de desenvolvimento começa a surgir, já não assente na agricultura mas na construção de bairros sociais em várias freguesias. A ligação por estrada a Lisboa, leva alguns grupos económicos a comprar na região grandes propriedades, enquanto a alta burguesia compra terrenos que transforma em quintas de férias.
É na Pontinha que, a 25 de abril de 1974, se instala o Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas que instaurará um regime democrático em Portugal. Atualmente, este quartel integra um Núcleo Museológico, criado através de um protocolo estabelecido entre o Regimento de Engenharia N.º 1 e a então Comissão Instaladora do Município de Odivelas.
Na região intensifica-se, a partir de então, o movimento de loteamento de terrenos que modificará profundamente a paisagem local. Nos 25 anos seguintes, surgem 85 bairros clandestinos. Simultaneamente, com a falta de habitação a preços acessíveis em Lisboa, verifica-se uma explosão da construção civil, surgindo em todas as freguesias do concelho, à exceção da de Famões, grandes urbanizações que se traduzem numa subida relâmpago do número de habitantes, com formas de estar na vida diferentes e mais exigentes daquelas que tinham até aí os habitantes da região.
O poder político tenta responder a essas aspirações criando as Freguesias da Pontinha (1984), de Olival Basto, da Ramada e de Famões (1989). A Póvoa de Santo Adrião passa a vila em 1986, Odivelas é elevada a cidade em 1990, a Pontinha sobe a vila (1991), o mesmo acontecendo ao Olival Basto em 1997. Neste mesmo ano, um grupo de cidadãos, defendendo um desenvolvimento próprio para a região, cria o «Movimento Odivelas a Concelho». No dia 19 de novembro de 1998, com o voto unânime dos Deputados de todas as forças políticas, a Assembleia da República votava, na especialidade, e em votação final global, o Projeto de Lei da Criação do Município de Odivelas. Ficando este dia, estipulado como Feriado Municipal. No dia 14 de dezembro de 1998, é publicado no Diário da República, a Lei n.º 84/98, da criação do Município de Odivelas referindo o seu Artigo 1º: "Através do presente diploma é criado o Município de Odivelas, com sede na Cidade de Odivelas, que fica a pertencer ao Distrito de Lisboa.
Em 20 de janeiro de 1999, a Comissão Instaladora do Município de Odivelas é empossada pelo então Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, Dr. João Cravinho. Depois de 3 anos de administração, a Comissão Instaladora cessa funções, e no seguimento das eleições autárquicas de dezembro de 2001, toma posse, no dia 4 de janeiro de 2002, a primeira Câmara Municipal de Odivelas.
No dia 28 de Janeiro de 2013, foi decretado em Diário da República, a Lei n.º 11-A/2013 – Reorganização Administrativa do Território das Freguesias – determinando que o Município de Odivelas contemple apenas quatro Uniões de Freguesia, com as seguintes denominações: Junta de Freguesia de Odivelas, União das Freguesias de Pontinha e Famões, União das Freguesias de Ramada e Caneças e União das Freguesias de Póvoa de Santo Adrião e Olival Basto.
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